domingo, 10 de março de 2019

Aborto e dor


Aborto e dor


Segundo as estatísticas, uma em cada cinco gestações não evolui. Uma em cada cinco mulheres que engravidaram, estão sem seus filhos nos braços. Somos muitas, mas é considerado um tabu falar a respeito.

Assim que a mulher planeja engravidar, já nasce uma mãe e junto com ela surge uma imensa carga de expectativas.
A gravidez é um momento especial na vida de uma mulher, uma experiência única. Época de mudança e descoberta de emoções e comportamentos até ali desconhecidos. Novas identidades, novos significados existenciais, novos papéis, novas exigências e necessidades afetivas em relação aos outros, principalmente ao filho, a quem a mulher se sente ligada desde o inicio por uma relação de dependência mútuo e progressiva.
A interrupção da gravidez é uma perda muito séria e demanda, sim, um período de dor e de sofrimento.
Quando a gravidez é interrompida de forma inesperada, a dor é incalculável e solitária. Outras pessoas da família também sentirão a perda, mas ninguém sentirá a dor do mesmo jeito que a mulher. O sentimento de impotência e incapacidade são profundos e dolorosos.

É muito comum a mulher se perguntar o que ela fez de errado. Se foi por causa de algum esforço físico, por trabalhar muito, por não se alimentar tão bem ou até mesmo por um castigo divino. Procura encontrar motivos, mesmo que incoerentes, causando ainda mais sofrimento.

Luto

O aborto é um processo traumático ligado a perda de um objeto de amor. A perda de um filho que nunca chegou, nunca foi ou será carregado, nunca se ouvirá seu choro ou sentirá seu cheiro, gera inúmeros conflitos emocionais.
É importante que o tempo de luto aconteça e que ele seja respeitado, sem ser considerado um exagero. O ideal é que aconteça o processo de elaboração, onde a mulher irá se entristecer e sentir a perda.  É apenas entrando em contato com a dor que a mulher conseguirá dar lugar à saudade e, assim, prosseguir sua rotina e se permitir investir em outras atividades.
Não significa que a dor um dia irá acabar, a perda de um filho é uma dor insuportável e a reconstrução só se torna possível quando se tem a liberdade de expressar sua dor e de renascer a partir da experiência vivida. A mulher nunca mais será a mesma, mas pode se tornar alguém melhor e mais forte.
O amor não morre, o amor que se tem por aquele bebê, independente da fase da gestação que se encontrava, será eterno. Não é preciso tentar esquece-lo.
O processo de luto precisa ter início, meio e fim. Não existe um tempo determinado para acontecer, pois cada mulher irá lidar com isso de forma diferente, mas quando ele passa a influenciar de forma muito negativa e paralisadora, sem que haja mudanças na maneira de enfrentar a perda, acontece o luto patológico, necessitando de ajuda profissional. 
Fases do luto:
1. Negação - a mulher não aceita que teve um aborto e tenta se convencer de que era um sonho.
2. Raiva - ela passa a se questionar por que aconteceu. chora e grita na tentativa de eliminar esse sentimento ruim.
3. Barganha - é aquele momento de oferecer algo em troca de uma nova gestação. Há casais que fazem até promessas.
4. Depressão - a tristeza profunda aparece quando os futuros pais se dão conta de que a perda é real.
5. Aceitação - o casal entende que é preciso passar por aquilo e seguir em frente.

Como prestar apoio?
Mais do que deve ser dito, o importante é mostrar que a pessoa não está sozinha, que tem alguém que a compreende e está disponível.
Evitar dar conselhos impeditivos do luto como: "Foi melhor assim"; "Provavelmente não estava na hora"; "Vocês vão engravidar novamente"; "Muitos passam por isso"; "É normal acontecer, então não precisa sofrer"; "Olhem o lado bom, agora terão um anjo olhando por vocês", entre outros.
O aborto é uma profunda dor narcísica, mas não é irreparável. Com o devido suporte e tempo a mulher pode lidar melhor com o ocorrido. Porém, é crucial manter em mente que a pessoa não voltará a ser a mesma. Um processo de luto como esse traz uma infinidade de novas concepções e significados acerca da vida. Isso não significa que haverá prejuízo ou que será uma mudança negativa, apenas que as coisas serão vistas de outra maneira depois de passar por isso.