segunda-feira, 30 de março de 2015

A fala do corpo

A fala do corpo

Minha amiga Opalanga, uma contadora de histórias, afro-americana, e
eu costumamos contar em conjunto uma história chamada "A fala do corpo" que trata da descoberta de bênçãos ancestrais dos nossos parentes. Opalanga é muito alta, e esbelta. Já minha estrutura é mais próxima do chão, com um corpo exuberante. Além de ser alvo de deboche por ser alta, Opalanga, quando criança, ainda tinha de ouvir que seus dentes incisivos separados eram um sinal de ser ela mentirosa. Já a mim diziam que o tamanho e o formato do meu corpo eram indícios de um ser inferior desprovido de autocontrole.
Enquanto estamos contando juntas nossas histórias sobre o corpo, Opalanga e
eu falamos dos golpes e flechadas que recebemos durante a vida inteira porque, de acordo com os Outros, com letra maiúscula, aos nossos corpos faltava algo ou sobrava algo. Na nossa apresentação, cantamos um lamento pelos corpos que não nos foi permitido usufruir. Dançamos, nos balançamos e olhamos uma para a outra. Nós duas consideramos que a outra tem uma aparência misteriosa tão bela, que como pôde alguém pensar o contrário?
Quando conheci Opalanga, nós duas tivemos a impressão de que nos conhecíamos, como costuma acontecer com as contadoras, não a vida inteira, mas há séculos. Entabulamos conversa sobre nossas histórias mais íntimas. Como fiquei perplexa ao ouvir que, já adulta, ela havia viajado até a Gâmbia, na África ocidental, e encontrado alguns membros da sua linhagem que, pasmem!, tinham na sua tribo muitas pessoas altas como ela, e esbeltas e com os incisivos separados. Explicaram-lhe que essa separação, quer dizer "abertura de Deus"... e era interpretada como um sinal de sabedoria.
Qual não foi a sua surpresa quando eu lhe disse que eu também, já adulta,
havia viajado até o  Tehuantepec no México e descoberto descendentes dos
meus antepassados que, pasmem!, eram uma tribo de mulheres gigantes fortes, brincalhonas e imponentes no tamanho. Elas me haviam dado tapinhas e pequenos puxões, observando abertamente que não estava suficientemente gorda. Eu não comia o suficiente? Elas explicaram que eu devia me
esforçar pois as mulheres são, redondas como a própria Terra, pois a Terra
contém muito. Portanto, na apresentação minha e de Opalanga, como nas nossas vidas, nossas histórias pessoais, que começaram com experiências repressoras e deprimentes, terminam com um sentido forte. Opalanga entende
que sua altura é sua beleza, seu sorriso é de sabedoria e que a voz de Deus está

sempre perto dos seus lábios. Eu entendo que meu corpo não é separado da terra, que meus pés foram feitos para firmar minha posição, que meu corpo tem a forma de um recipiente feito para conter muito. Nós duas aprendemos, com gente vigorosa fora da nossa própria cultura norte-americana, a reavaliar o corpo, a refutar idéias e expressões que ultrajassem o corpo misterioso, que ignorassem o corpo feminino enquanto instrumento de conhecimento.


Como  entrar  em harmonia com seu corpo ?

Como você vê e sente seu corpo?

Você permite que o julgamento do outro interfira na sua alto aceitação?  Se sim,como mudar?

Como está o seu corpo: ele tem medo? Está paralisado pela dor ou pelo receio? Está anestesiado por traumas antigos?

O seu corpo tem a sua própria musica? Você está no ritmo com essa dança?


A Simbologia Mulher
A luz surge e com o tempo minha manhã se torna minha jornada ...do começo de cada dia da minha vida....
Quantos dias tive ao pensar em Fazer e Ser feliz comigo mesma....
Fui até bem distante da minha vida em  Sentir e  Ver  a vida passar...
Meu corpo sentiu bem  esse tempo ?...
Toda luta que enfrentei  para estar na minha vida ...Está hoje desenhada no meu corpo...
Quantas noites observando essas mudanças na pele e alma...
E confesso as lágrimas rolam pela face...
No espelho, vejo dentro do meu olho essa alma ....essa mulher ....
Tenho orgulho da mulher passado e mulher presente...
Aqui estou com elas sempre juntas vencendo o tempo e a gravidade...
Existe coisa mais forte do que nós?...

segunda-feira, 16 de março de 2015

A mulher-esqueleto

A Mulher-esqueleto


Ela havia feito alguma coisa que seu pai não aprovava, embora
ninguém mais se lembrasse do que havia sido. Seu pai, no entanto, a havia
arrastado até os penhascos, atirando-a ao mar. Lá, os peixes devoraram
sua carne e arrancaram seus olhos. Enquanto jazia no fundo do mar, seu
esqueleto rolou muitas vezes com as correntes.
Um dia um pescador veio pescar. Bem, na verdade, em outros
tempos muitos costumavam vir a essa baía pescar. Esse pescador, porém,
estava afastado da sua colônia e não sabia que os pescadores da região não
trabalhavam ali sob a alegação de que a enseada era mal-assombrada.
O anzol do pescador foi descendo pela água abaixo e se prendeu —
logo em quê! — nos ossos das costelas da Mulher-esqueleto. O pescador
pensou: "Oba, agora peguei um grande de verdade! Agora peguei um
mesmo!" Na sua imaginação, ele já via quantas pessoas esse peixe enorme

iria alimentar, quanto tempo sua carne duraria, quanto tempo ele se veria
livre da obrigação de pescar. E enquanto ele lutava com esse enorme peso
na ponta do anzol, o mar se encapelou com uma espuma agitada, e o
caiaque empinava e sacudia porque aquela que estava lá embaixo lutava
para se soltar. E quanto mais ela lutava, tanto mais ela se enredava na linha.
Não importa o que fizesse, ela estava sendo inexoravelmente arrastada
para a superfície, puxada pelos ossos das próprias costelas.
O pescador havia se voltado para recolher a rede e, por isso, não viu
a cabeça calva surgir acima das ondas; não viu os pequenos corais que
brilhavam nas órbitas do crânio; não viu os crustáceos nos velhos dentes
de marfim. Quando ele se voltou com a rede nas mãos, o esqueleto inteiro,
no estado em que estava, já havia chegado à superfície e caía suspenso da
extremidade do caiaque pelos dentes incisivos.
— Agh! — gritou o homem, e seu coração afundou até os joelhos,
seus olhos se esconderam apavorados no fundo da cabeça e suas orelhas
arderam num vermelho forte. — Agh! — berrou ele, soltando-a da proa
com o remo e começando a remar loucamente na direção da terra. Sem
perceber que ela estava emaranhada na sua linha, ele ficou ainda mais
assustado pois ela parecia estar em pé, a persegui-lo o tempo todo até a
praia. Não importava de que jeito ele desviasse o caiaque, ela continuava
ali atrás. Sua respiração formava nuvens de vapor sobre a água, e seus
braços se agitavam como se quisessem agarrá-lo para levá-lo para as
profundezas.
— Aaagggggghhhh! — uivava ele, quando o caiaque encalhou na
praia. De um salto ele estava fora da embarcação e saía correndo agarrado
à vara de pescar. E o cadáver branco da Mulher-esqueleto, ainda preso à
linha de pescar, vinha aos solavancos bem atrás dele. Ele correu pelas
pedras, e ela o acompanhou. Ele atravessou a tundra gelada, e ela não se
distanciou. Ele passou por cima da carne que havia deixado a secar,
rachando-a em pedaços com as passadas dos seus mukluks.
O tempo todo ela continuou atrás dele, na verdade até pegou um
pedaço do peixe congelado enquanto era arrastada. E logo começou a
comer, porque há muito, muito tempo não se saciava. Finalmente, o
homem chegou ao seu iglu, enfiou-se direto no túnel e, de quatro,
engatinhou de qualquer jeito para dentro. Ofegante e soluçante, ele ficou
ali deitado no escuro, com o coração parecendo um tambor, um tambor
enorme. Afinal, estava seguro, ah, tão seguro, é, seguro, graças aos deuses,

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Raven, é, graças a Raven, é, e também à todo-generosa Sedna, em
segurança, afinal. Imaginem quando ele acendeu sua lamparina de óleo de
baleia, ali estava ela — aquilo — jogada num monte no chão de neve, com
um calcanhar sobre um ombro, um joelho preso nas costelas, um pé por
cima do cotovelo. Mais tarde ele não saberia dizer o que realmente
aconteceu. Talvez a luz tivesse suavizado suas feições; talvez fosse o fato
de ele ser um homem solitário. Mas sua respiração ganhou um quê de
delicadeza, bem devagar ele estendeu as mãos encardidas e, falando
baixinho como a mãe fala com o filho, começou a soltá-la da linha de
pescar.
— Oh, na, na, na. — Ele primeiro soltou os dedos dos pés, depois
os tornozelos. — Oh, na, na, na. — Trabalhou sem parar noite adentro,
até cobri-la de peles para aquecê-la, já que os ossos da Mulher-esqueleto
eram iguaizinhos aos de um ser humano.
Ele procurou sua pederneira na bainha de couro e usou um pouco
do próprio cabelo para acender mais um foguinho. Ficou olhando para ela
de vez em quando enquanto passava óleo na preciosa madeira da sua vara
de pescar e enrolava novamente sua linha de seda. E ela, no meio das peles,
não pronunciava palavra — não tinha coragem — para que o caçador não
a levasse lá para fora e a jogasse lá embaixo nas pedras, quebrando
totalmente seus ossos.
O homem começou a sentir sono, enfiou-se nas peles de dormir e
logo estava sonhando. Às vezes, quando os seres humanos dormem,
acontece de uma lágrima escapar do olho de quem sonha. Nunca sabemos
que tipo de sonho provoca isso, mas sabemos que ou é um sonho de
tristeza ou de anseio. E foi isso o que aconteceu com o homem.
A Mulher-esqueleto viu o brilho da lágrima à luz do fogo, e de
repente ela sentiu uma sede daquelas. Ela se aproximou do homem que
dormia, rangendo e retinindo, e pôs a boca junto à lágrima. Aquela única
lágrima foi como um rio, que ela bebeu, bebeu e bebeu até saciar sua sede
de tantos anos.
Enquanto estava deitada ao seu lado, ela estendeu a mão para dentro
do homem que dormia e retirou seu coração, aquele tambor forte. Sentouse
e começou a batucar dos dois lados do coração: Bom, Bomm!... Bom,
Bomm!
Enquanto marcava o ritmo, ela começou a cantar em voz alta.


— Carne, carne, carne! Carne, carne, carne! — E quanto mais
cantava, mais seu corpo se revestia de carne. Ela cantou para ter cabelo,
olhos saudáveis e mãos boas e gordas. Ela cantou para ter a divisão entre
as pernas e seios compridos o suficiente para se enrolarem e dar calor, e
todas as coisas de que as mulheres precisam.
Quando estava pronta, ela também cantou para despir o homem
que dormia e se enfiou na cama com ele, a pele de um tocando a do outro.
Ela devolveu o grande tambor, o coração, ao corpo dele, e foi assim que
acordaram, abraçados um ao outro, enredados da noite juntos, agora de
outro jeito, de um jeito bom e duradouro.
As pessoas que não conseguem se lembrar de como aconteceu sua
primeira desgraça dizem que ela e o pescador foram embora e sempre
foram bem alimentados pelas criaturas que ela conheceu na sua vida
debaixo d'água. As pessoas garantem que é verdade e que é só isso o que

sabem.

quinta-feira, 12 de março de 2015

A importancia de brincar com a criança!

A brincadeira é muito importante para o desenvolvimento da criança. É através dela que a criança aprende regras e estratégias, fantasia o mundo e amadurece emocionalmente.

É vital para a relação entre pais e filhos que se crie oportunidades para a brincadeira acontecer.

Por exemplo: na hora do banho da criança, leve alguns brinquedos e uma bacia. Fantasie uma cidade aquática ou uma viagem de barco!

Crie uma “cabaninha” na sala, usando moveis e um lençol, uma aventura inesquecível pode surgir!

Usar artigos da cozinha para simular uma orquestra, ou almofadas para serem montanhas.... Qualquer coisa serve para incentivar a sua criatividade e a do seu filho.


Permita-se! Aproveite!

segunda-feira, 2 de março de 2015

Complexo de Cinderela

Complexo de Cinderela?

No conto de fadas “Cinderela”, a bela moça espera pelo seu príncipe encantado. Ela deseja ser  encontrada, ela quer ser a escolhida, ela espera....

Na vida real, muitas mulheres em algum momento da vida, se não a vida toda,  vivem o papel da  “Cinderela” e querem ser assumidas por um outro, querem ser dependentes dele. Financeiramente, emocionalmente e espiritualmente. Elas depositam no outro, ou seja, no príncipe encantado imaginário, toda a expectativa de uma vida feliz.

Coitado desse “príncipe”, quanta responsabilidade é depositada nesse sujeito!! Ele tem a OBRIGAÇÃO de sustentar a bela moça, de ser a estrutura dela e de faze-la feliz!! Só que ele não pode!  A felicidade nunca esta lá fora e é isso que a Cinderela não entende e quando perceber que o príncipe não conseguirá responder suas expectativas, ficará frustrada.

Colette Dowling definiu o Complexo de Cinderela como uma rede de atitudes e temores profundamente reprimidos que retém as mulheres numa espécie de penumbra e impede-as de utilizarem plenamente seus intelectos e criatividade.

Portanto, a mulher deixa de usar seu intelecto e sua criatividade de maneira plena. Isso é muito serio e infelizmente muito comum. Mulheres bem sucedidas ou não, dotadas de muita inteligência e criatividade sofrem pela necessidade de que algo externo transforme a sua vida.

A criatividade é a alma da mulher, e neste momento podemos considerar que ela esta sem sua alma, sem sua essência.

Para lidar com isso, precisamos em primeiro lugar reconhecer o que esta acontecendo conosco. Estou eu esperando que outro ou algo de fora venha transformar a minha vida? Que venha cuidar de mim?

Essa é a pergunta que devemos sempre responder internamente. E após esse reconhecimento, é  preciso tomar as rédeas da vida de volta. As verdadeiras mudanças acontecem de maneira solitária, no fundo da nossa psique. Precisamos assumir o cuidado sobre nós mesmas.





Patinho Feio

A procura da nossa turma: A sensação da integração com uma bênção.
O patinho feio: a descoberta daquilo a que pertencemos.
O patinho feio
Já estava quase na época da colheita. As velhas faziam bonecas verdes com a palha do milho. Os velhos remendavam cobertores. As moças bordavam flores de um vermelho vivo nos seus vestidos brancos. Os rapazes cantavam enquanto empilhavam o feno dourado. As mulheres tricotavam blusões ásperos para o inverno que viria. Os  homens ajudavam a colher, arrancar, cortar e ceifar os frutos que os campos haviam produzido. O vento apenas começava a soltar as folhas um pouco mais, e mais um pouco a cada dia que passava. E lá para os lados do rio, uma pata chocava uma ninhada de ovos.Tudo estava indo como deveria para essa mãe pata e, afinal, um a um, os ovos começaram a tremer e sacudir até que as cascas racharam e deles saíram cambaleantes seus novos filhotes. Restava, porém, um ovo, um ovo muito grande. Ele estava ali parado como uma pedra.Uma velha pata veio visitar, e a mãe pata exibiu seus filhotes.
— Eles não são lindos? — gabou-se ela. Mas o ovo ainda sem rachar chamou a atenção da velha pata, e esta tentou dissuadir a mãe de continuar a chocar aquele ovo.
— É um ovo de peru —exclamou a velha pata.
— Absolutamente não serve como ovo. Não se pode levar um peru para dentro d'água, você sabia?
 — Ela sabia,porque já havia tentado. A mãe pata, no entanto, achou que estava chocando há tanto tempo que mais um pouquinho não ia fazer mal.
— Não estou preocupada com isso — disse ela. — Mas você sabia que o safado do pai desses patinh0s ainda não veio me visitar uma vez sequer? Afinal, o ovo grande começou a estremecer e a rolar. Acabou quebrando, e dele saiu uma criatura grande e desajeitada. Sua pele era marcada por veias sinuosas azuis e vermelhas. Seus pés eram de um roxo claro. Seus olhos, de um rosa transparente. A mãe pata inclinou a cabeça, esticou o pescoço e o contemplou. Não pôde se conter: ele era feio mesmo. "Talvez seja mesmo um peru", preocupou-se ela. Contudo, quando o patinho feio entrou na água acompanhando os outros filhotes, a mãe pata viu que ele nadava muito bem. "É, ele é dos meus, apesar de ter essa aparência tão estranha. No fundo, porém, do ângulo certo... ele é quase bonito." E assim ela o apresentou às outras criaturas do quintal da fazenda, mas, antes que percebesse, outro pato atravessou o quintal a toda e bicou o patinho feio bem no pescoço.
— Pare com isso! — gritou a mãe pata.
— Ora, ele é tão feio e esquisito. Ele precisa que o maltratem — retrucou o valentão.
— Oh, mais uma ninhada! Como se já não tivéssemos bocas demais a alimentar!
 — exclamou a pata rainha com o trapo vermelho na perna.
 — E aquele lá, aquele grandão e feio. Bem, aquilo sem dúvida é um engano.
— Ele não é um engano — disse a mãe pata.
— Ele vai ser muito forte. Foi só que ele ficou tempo demais dentro do ovo e ainda está meio deformado. Mas ele vai se recuperar. Vocês vão ver. — Ela limpou com o bico as penas do patinho feio e lambeu seu topete. Os outros, no entanto, faziam tudo o que podiam para importunar o patinho feio. Voavam para atacá-lo, bicavam-no e gritavam com ele. E à medida que o tempo passava, eles o atormentavam cada vez mais. Ele se escondia, se desviava, saía em ziguezague, mas não conseguia escapar. O patinho era a mais infeliz das criaturas. A princípio, sua mãe o defendia, mas com o tempo até ela se cansou daquilo tudo.
— Como eu queria que você fosse embora
— exclamou exasperada. E foi assim que o patinho feio fugiu. Com a maior parte das suas penas arrancada e todo enlameado, ele correu e correu até chegar a um pântano. Ali ele se deitou à beira d'água com o pescoço esticado e sorvia um pouco d'água de vez em quando. Dos juncos dois gansos o observavam. Eram jovens e cheios de si.
— Ei, você aí, criatura horrorosa — disseram, rindo à socapa.
— Quer vir conosco até o próximo condado? Há um bando de gansas solteiras por lá, prontas para serem escolhidas. De repente, ecoaram tiros. Os gansos caíram com um baque e a água do pântano ficou vermelha com seu sangue. O patinho feio mergulhou para se abrigar, e por toda a parte só havia tiros, fumaça e cães latindo. Afinal, o pântano ficou tranqüilo, e o patinho saiu correndo e voando a maior distância possível. Perto do anoitecer, ele chegou a um pobre casebre. A porta estava pendurada de um barbante, e havia mais fendas do que paredes. Ali vivia uma velha esfarrapada com seu gato desgrenhado e sua galinha vesga. O gato fazia jus a morar com a velha por apanhar camundongos. A galinha, por botar ovos. A velha achou que estava com sorte por ter encontrado um pato. Talvez fosse uma pata e também botasse ovos e, se não fosse, podemos matá-lo para comer. E assim o pato ficou, mas ele era perseguido pelo gato e pela galinha.
— Para que você serve se não bota ovos e não sabe apanhar camundongos?
—perguntavam-lhe os dois.
— O que mais gosto de fazer
— disse o patinho com um suspiro
— é ficar "debaixo", quer seja debaixo da amplidão azul do céu, quer debaixo do frescor azul da água.
 — O gato não via nenhum sentido em querer ficar debaixo d'água e criticou o patinho pelos seus sonhos idiotas. A galinha não conseguia ver a graça de ficar com as penas molhadas e também debochou do patinho. No final das contas, ficou claro que aqui também não haveria paz para o patinho, e por isso ele partiu para ver se as coisas podiam ser melhores mais adiante. Ele encontrou por acaso um laguinho e, enquanto estava nadando, foi ficando cada vez mais frio. Um bando de aves passou voando lá em cima, as mais lindas que ele já havia visto. Elas gritaram para cumprimentá-lo, e ouvir suas vozes fez com que o coração do patinho saltasse e se apertasse ao mesmo tempo. Ele gritou de volta com uma voz que nunca havia emitido antes. Ele nunca havia visto criaturas mais lindas, e nunca havia se sentido mais desolado. Ele girou e girou na água para observá-las enquanto desapareciam nos céus e depois mergulhou até o fundo do lago e ali se aninhou, trêmulo. Estava fora de si por sentir um amor desesperançado por aqueles enormes pássaros brancos, um amor que ele não conseguia entender.Um vento mais frio começou a soprar e foi ficando cada vez mais forte com o passar dos dias. E a neve caiu sobre o gelo. Os velhos quebravam o gelo nos baldes deleite, e as velhas fiavam até tarde da noite. As mães alimentavam três bocas de cada vez à luz de velas, e os homens saíam à procura de ovelhas sob o céu branco da meia noite. Os jovens entravam na neve até a cintura para ir ordenhar, e as moças imaginavam ver o rosto de rapazes bonitos nas chamas do fogão enquanto cozinhavam. E no lago ali por perto, o patinho precisava nadar cada vez mais rápido em círculos para manter um lugar aberto no gelo. Um dia de manhã, o patinho se descobriu preso no gelo e foi aí que ele sentiu que ia morrer. Dois patos selvagens vieram voando e chegaram escorregando no gelo. Eles observaram o patinho.
— Como você é feio — grasnaram.
— Que pena. É uma tristeza. Não se pode fazer nada por alguém como você.
 — E saíram voando. Felizmente, um lavrador passou por ali e libertou o patinho quebrando o gelo com seu cajado. Ele levantou o patinho, abrigou-o no casaco e voltou para casa. Na casa do lavrador, as crianças quiseram pegar o patinho, mas ele teve medo. Voou até os caibros do telhado, fazendo com que toda a poeira caísse na manteiga. De lá de cima, ele mergulhou direto para dentro do balde de leite e, quando ia saindo todo  molhado e grudento, caiu no barril de farinha de trigo. A mulher do lavrador saiu atrás dele com uma vassoura enquanto as crianças riam a mais não poder. O patinho saiu agitado pela porta do gato e, lá fora afinal, caiu quase morto na neve. Dali, ele se forçou a prosseguir até chegar a mais um lago, a mais uma casa, a outro lago, a outra casa, e o inverno inteiro transcorreu dessa forma, alternando entre a vida e a morte. Mesmo assim, a brisa suave da primavera voltou. As velhas vieram arejar os acolchoados, e os velhos guardaram suas ceroulas compridas. Novos bebês chegavam no meio da noite, enquanto seus pais andavam de um lado para o outro no quintal, debaixo do céu estrelado. Durante o dia, as moças enfiavam narcisos nos cabelos, e os rapazes examinavam os tornozelos femininos. E num lago por ali, a água ficou mais agradável e o patinho feio que nela boiava abriu as asas. Como eram grandes e fortes as suas asas. Elas o levaram bem para o alto acima da terra. Dos céus, ele via os pomares com seus mantos brancos, os lavradores arando, os jovens de toda a natureza saindo da casca, tropeçando, zumbindo e nadando. Também brincando na água do lago havia três cisnes, as mesmas criaturas maravilhosas que ele havia visto no outono; aquelas que lhe haviam causado um aperto tão forte no coração. Ele sentiu um impulso de se unir a elas. E se fingirem que gostam de mim, e depois, assim que eu me aproximar, saírem voando às risadas? pensou o patinho. Ele desceu planando e pousou no lago, com o coração batendo forte. Assim que o viram, os cisnes começaram a nadar na sua direção. Sem dúvida,estou a ponto de encontrar meu fim, pensou o patinho, mas, se tenho de ser morto, melhor que seja por essa lindas criaturas do que pela mão de caçadores, donas-decasa ou longos invernos. E abaixou a cabeça para aguardar os golpes. Que surpresa! Na imagem na água ele viu um cisne em traje a rigor: plumagem branca como a neve, olhos escuros e tudo o mais. O patinho feio a princípio não se reconheceu porque era exatamente igual aos belos estranhos, igual àqueles que ele havia admirado de longe. E acabou se revelando que ele era um deles no final das contas. Seu ovo por acaso havia rolado para um ninho de patos. Ele era um cisne, um cisne magnífico. E pela primeira vez sua própria família se aproximava dele, tocando-o com cuidado e carinho com as pontas das asas. Eles lhe limparam as penas com seus bicos e nadaram muito ao seu redor para cumprimentá-lo.

— Ei, tem mais um cisne! — gritaram as crianças que vinham trazer migalhas de pão para os cisnes. Como costumam fazer as crianças de qualquer lugar, elas correram para contar a todos. As velhas vieram até a beira d'água, destrançando seus longos cabelos prateados. Os rapazes juntavam nas mãos em taça um pouco da água limpa e a atiravam na direção das moças, que enrubesciam como pétalas. Os homens tiraram uma folga da ordenha só para tomar um pouco daquele ar. As mulheres pararam um pouco de remendar só para rir com seus parceiros. E os velhos começaram a contar histórias sobre como a guerra é longa e a vida é curta. E um a um, fosse pela vida, pela paixão, fosse porque o tempo estava passando, todos se afastaram dançando. Os rapazes, as moças, todos foram embora dançando. Os mais velhos, os maridos, as esposas, todos foram embora dançando. As crianças e os cisnes também se afastaram dançando... deixando ali só nós... a primavera... e mais uma mãe pata chocando seus ovos junto ao rio.

VOCÊ JÁ SE SENTIU FORA DO SEU MEIO,FAMILIA E OU SOCIAL? COMO REAGIU?

VOCÊ JÁ FOI RESGATADA POR ALGUÉM FORA DO SEU GRUPO? COMO FOI?

La loba

La Loba
Existe uma velha que vive num lugar oculto de que todos sabem, mas que poucos já viram.   Como nos contos de fadas da Europa oriental, ela parece esperar que cheguem até ali pessoas que se perderam, que estão à procura de algo.    Ela é quase sempre cabeluda e invariavelmente gorda, e demonstra especialmente querer evitar a maioria das pessoas.  Ela sabe imitar um grito de corvo e cacarejar, apresentando geralmente mais sons animais do que humanos. Dizem que ela vive entre os declives de granito decomposto no território dos índios tarahuma.  Dizem que está enterrada perto de um poço. Dizem que foi vista viajando para o sul,  num carro incendiado com a janela traseira arrancada.  Dizem que fica parada na estrada perto de El Paso, que pega carona aleatoriamente com caminhoneiros até México.
Ela é conhecida por muitos nomes: La Loba, a Mulher dos Ossos, a Mulher-lobo. O único trabalho de La Loba é o de recolher ossos. Sabe-se que ela recolhe e conserva especialmente o que corre o risco de se perder para o mundo. Sua caverna é cheia dos ossos de todos os tipos de criaturas do deserto: o veado, a cascavel, o corvo. Dizem, porém, que sua especialidade reside nos lobos. Ela se arrasta sorrateira as montanhas os leitos secos, à procura de ossos de lobos e, quando consegue reunir um esqueleto inteiro, quando o último osso está no lugar e a bela escultura branca da criatura está disposta à sua frente, ela senta junto ao fogo e pensa na Canção que irá cantar. Quando se decide, ela se levanta e aproxima-se da criatura, ergue seus braços sobre o esqueleto e começa a cantar. É aí que os ossos das costelas e das pernas do lobo começam a se forrar de carne, e que a criatura começa a se cobrir de pêlos. La Loba canta um pouco mais, e uma proporção maior da criatura ganha vida. Seu rabo forma uma curva para cima, forte e desgrenhada. La Loba canta mais, e a criatura-lobo começa a respirar. La Loba canta, com tanta intensidade que o chão do deserto estremece, e enquanto canta, o lobo abre os olhos, dá um salto e sai correndo pelo desfiladeiro. Em algum ponto da corrida, quer pela velocidade, por atravessar um rio respingando água, quer pela incidência de um raio de sol ou de um luar sobre seu flanco, o lobo de repente é transformado numa mulher que ri e corre livre na direção do horizonte. Por isso, diz  que, se você estiver perambulando pelo deserto, por volta do pôr-do-sol, e quem sabe esteja um pouco perdido, cansado, sem dúvida você temsorte, porque La Loba pode simpatizar com você e lhe ensinar algo — ( algo da alma).


O que aconteceu com a voz da minha alma?

Quais são os ossos enterrados na minha vida?

Quando foi a ultima vez que corri livremente?



La Loba é quem cuida do que já morreu e do que está morrendo nas mulheres.
Hoje   La Loba   dentro de vocês  está  recolhendo ossos.
O que ela esta recriando?
Ela é a construtora do lar da alma.

O que ela esta fazendo por você ?